Luis Miguel no Brasil: entre expectativas e realidades de assessoria de imprensa e produção
Cobrir o show de Luis Miguel, realizado no último sábado, 23 de março, no Allianz Parque, em São Paulo, prometia ser um marco em minha carreira de jornalista do interior, habituado às nuances do circuito sertanejo e às peculiaridades de produções locais. Este evento, no entanto, se desdobrou em uma série de revelações sobre os bastidores da grande indústria do entretenimento, contrastando com a grandiosidade do artista conhecido como "El Sol de México".
Luis Miguel, que iniciou sua turnê em 2022, não apenas quebrou recordes de público, mas também estabeleceu novos padrões de expectativa para shows internacionais. A sofisticação e a magnitude desses eventos deveriam refletir em todos os aspectos, incluindo o tratamento da imprensa e a organização da produção.
Minha jornada para este grande evento começou com a aprovação do credenciamento, notificada via WhatsApp, um gesto moderno que parecia prenunciar uma experiência integrada e respeitosa com os profissionais de mídia. A promessa de acesso privilegiado à frente do palco durante as duas primeiras músicas do show pintava um quadro de consideração pelos veículos de imprensa que noticiaram e noticiariam o pós-show.
Chegando lá, a expectativa desmoronou rapidamente. Em vez de nos direcionarem para a frente do palco, conforme combinado, fomos alojados no 'house mix', o espaço técnico reservado para a equipe de som e iluminação. A perplexidade tomou conta quando ficou claro que a produção de Luis Miguel não nos permitiria ficar ali. "Oi? Não tinha sido combinado antes?" foi a pergunta que ecoou. A falta de comunicação interna era evidente, e me deixou em um estado de confusão e frustração. O membro da equipe de produção, de forma abrupta e grosseira, nos informou que aquela não era nossa área, obrigando-nos a deixar o local. Essa abordagem ríspida foi um choque, especialmente considerando a natureza do evento e o prestígio do artista. E a assessoria de imprensa parecia mais perdida que nós ali.
O show, que iniciou com atraso de 40 minutos e com o reinício da chuva, limitou a experiência da imprensa às duas primeiras músicas, e antes, havíamos sido informados que Luis Miguel não daria atenção à mídia. Isso contradizia a importância habitualmente concedida à imprensa, que desempenha um papel crucial na divulgação e no sucesso de eventos dessa magnitude.
Desde o início, achei estranho o distanciamento de Luis Miguel com a imprensa, considerando sua posição como um artista de renome mundial. A imprensa desempenha um papel crucial em noticiar seus shows e em construir a narrativa em torno de sua carreira. É irônico pensar que, no começo de suas trajetórias, muitos artistas buscam avidamente a atenção da mídia para ganhar visibilidade. No entanto, uma vez consolidados, alguns, como Luis Miguel, parecem se afastar, e suas equipes de produção frequentemente seguem esse exemplo, dando pouca atenção aos veículos de comunicação. Este comportamento ressalta uma curiosa inversão de prioridades, onde a necessidade de publicidade dá lugar a uma aparente indiferença, mesmo quando a mídia continua a ser um pilar essencial para o sucesso contínuo no cenário artístico.
Após sermos permitidos a fotografar apenas durante as duas primeiras músicas, fomos informados de que deveríamos encontrar um lugar na arquibancada não numerada, que já estava completamente cheia (ou entao irmos embora, né?!). Enquanto a chuva caía, simbolizando a assessoria de imprensa "lavando as mãos" diante da situação que já tinha sido embaraçosa, ficou clara a falta de planejamento e consideração com os profissionais de mídia, forçando-nos a lidar com as adversidades sem apoio organizacional.
Como fã, a experiência também foi desapontadora. Luis Miguel, apesar de sua fama, ofereceu um espetáculo sem interações significativas com o público, limitando-se a performar suas canções sem o calor e a proximidade esperados de um artista de seu calibre. Já havia assistido a trechos do show de Luis Miguel na Argentina e, ao vivenciar o evento ao vivo em São Paulo, senti como se tivesse entrado em um vídeo do YouTube, tal era a semelhança com o que já tinha visto: a mesma falta de interação, as notas musicais não totalmente alcançadas, e o característico rebolado de um lado para o outro. Apesar de apreciar o espetáculo como fã, a experiência me deixou reticente. Concluí que, talvez, seja melhor desfrutar da música de Luis Miguel através de plataformas digitais ou gravações, onde as expectativas de um show ao vivo, com sua energia e conexão, não se sobrepõem à realidade de uma performance que pareceu mais uma reprodução do que uma experiência única e envolvente.
A falta de espontaneidade e a sensação de uma performance ensaiada e repetitiva contrastavam com a expectativa de vivenciar algo único e especial em um show ao vivo de um artista de sua estatura.
Este evento serviu como uma aula prática sobre a complexidade e os desafios enfrentados pela assessoria de imprensa e pela produção em grandes eventos internacionais. A assessoria de imprensa, em sua essência, deve ser a ponte entre o artista e o público, através da mídia, garantindo que a comunicação seja clara, precisa e benéfica para todas as partes envolvidas. Espera-se que uma assessoria competente antecipe as necessidades dos jornalistas, providencie informações detalhadas, acesso necessário e oportunidades de cobertura, especialmente em eventos com estrelas internacionais, onde o interesse público é ampliado.
Diante de uma figura de renome como Luis Miguel, a assessoria de imprensa tem a responsabilidade ainda maior de gerenciar expectativas, coordenar entrevistas (ok, nesse caso já tínhamos sido informados que ele não atenderia imprensa), e facilitar um canal de comunicação eficaz entre o artista e a mídia. O objetivo deve ser criar uma atmosfera de respeito mútuo, onde a imprensa possa realizar seu trabalho de maneira eficiente e digna.
Quanto à produção, sua abordagem com a imprensa deve ser de colaboração e respeito, entendendo que os jornalistas e fotógrafos são essenciais para documentar e transmitir a essência do evento ao mundo. Deve haver um esforço consciente para garantir que a logística, o acesso e as facilidades estejam alinhados com as necessidades da cobertura de imprensa, evitando mal-entendidos ou tratamento descortês, como foi observado neste evento. A produção deve trabalhar em uníssono com a assessoria de imprensa para garantir que a experiência seja positiva para todos os envolvidos, refletindo profissionalismo e consideração, independentemente da estatura do evento ou do artista em questão.
Como profissional de imprensa, reitero a necessidade de um tratamento digno e respeitoso para com a mídia, assim como a importância de uma comunicação interna eficiente e transparente. A experiência sublinhou o fato de que, independentemente do renome e do sucesso, a organização, a comunicação interna, humildade e o respeito mútuo devem prevalecer em todas as interações, assegurando a integridade e a qualidade da experiência, tanto para os profissionais envolvidos quanto para o público.